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De Carolina (MA), Ex-mendigo Viciado em Crack dá Volta por Cima e Vira Empresário no DF

Data do post: 19/11/2017 23:34:39 - Visualizações: (9605)

Há 1.548 dias livre do crack, o carolinense Adeílson Mota ganha a vida fabricando e vendendo móveis. Agenda cheia até fevereiro de 2018.

Foto: Hugo BarretoAs  mãos rápidas de Adeílson Mota de Carvalho lapidando a madeira dão forma a armários, guarda-roupas e camas. O empresário de 41 anos não tem tempo a perder. Com a agenda lotada até fevereiro de 2018, corre de um lado para o outro a fim de conseguir entregar no prazo todas as encomendas. Orgulhoso, garante “fazer serviço de primeira” e desafia a reportagem a ligar para todos os seus clientes. “Eles podem atestar a qualidade do meu trabalho”.

O grande volume de pedidos por móveis fez Adeílson deixar o aluguel. Há cinco meses, comprou a casa própria, em São Sebastião, e, num espaço de 20 metros quadrados, montou sua marcenaria. Seria apenas mais uma história de sucesso impulsionada pela força do trabalho, mas um ingrediente torna a conquista pessoal de Adeílson digna dos melhores filmes.

Há pouco mais de quatro anos, o maranhense de Carolina vivia maltrapilho perambulando pelo Plano Piloto. Esquelético, pesava menos de 60 quilos – hoje tem 90. A alimentação não era prioridade, pois o dinheiro que conseguia catando latinha e vigiando carros era investido em pedras de crack.

Foto: Hugo BarretoNa rua, flertou com a morte várias vezes. A consciência pedia liberdade, mas o corpo estava preso ao vício na pedra. A sorte, no entanto, resolveu cruzar o caminho de Adeílson. E ela veio na figura de Felipe Dourado de Paiva, um estudante universitário de classe média alta, morador do Guará, que estava desaparecido havia 13 dias. Desesperados, os pais iniciaram uma campanha para localizá-lo.

Por volta das 16h do dia 22 de agosto de 2013, Adeílson caminhava próximo à antiga Rodoferroviária de Brasília, quando viu o rapaz dentro de uma caixa de papelão. Mesmo sob efeito de droga, Adeílson reconheceu o jovem, pois havia visto um cartaz colado em um poste com a foto dele.

Antes de acionar a polícia, o então morador de rua e usuário de crack tranquilizou o rapaz. Para os parentes de Felipe, era o fim de uma agonia; para Adeílson, o começo de uma nova vida.

E lá se vão 1.548 dias limpos

Foto: Hugo BarretoOs familiares de Felipe ofereceram R$ 5 mil em recompensa, que Adeílson trocou por uma transformação. No lugar do dinheiro, pediu ajuda para deixar o vício. Com a orientação dos parentes do universitário, foi internado na casa terapêutica Salve a Si, situada na Cidade Ocidental. O tratamento não apenas o fez largar o crack, mas também o inspirou a resgatar o dom da marcenaria aprendido na infância. E lá se vão 1.548 dias “limpos”.

Para ele, o tempo transcorrido representa renovação e oportunidade. “A minha sensação é como se tudo o que fiz antes de 2013 tivesse sido apagado do meu livro pessoal. As páginas ficaram em branco. O meu melhor momento é agora. O dom da marcenaria me salvou. A minha história começou a ser escrita novamente”, sentencia, emocionado, mas com firmeza.

O tempo de sem-teto ficou definitivamente no passado. De lá para cá, Adeílson tem investido na carreira e se desdobrado para cumprir as ordens de serviço. São 20 trabalhos que devem ser entregues até fevereiro de 2018. “Eu não tinha como imaginar toda essa mudança. Tudo aqui é fruto do meu suor. Eu comprei as máquinas, mandei construir a oficina e tenho funcionários para me ajudar”, comemora.

Foto: Hugo BarretoA marcenaria lhe rendeu não só a oportunidade de ter o imóvel próprio. Os pés, antes castigados, calçam agora sapatos e tênis da moda. A bonança no trabalho lhe proporcionou realizar o sonho de infância de ter veículos potentes. Na garagem, estão guardados uma caminhonete Hillux e uma moto Honda CBR Fireblade.

Mas as mudanças na vida de Didi – como é carinhosamente chamado por amigos – não se resumem ao incremento na conta bancária. O amor bateu à porta do empresário. Quando já estava longe das drogas, ele retomou contato com a prima Teresa Mota Barros, 33, que morava em Estreito no Maranhão (MA) e, em junho de 2014, os dois iniciaram um namoro a distância. “Com três meses de relacionamento, nos casamos e ele me trouxe para Brasília. O Adeílson é o homem da minha vida. Eu tenho muito orgulho da história de superação dele”, diz a apaixonada Teresa.

Se depender do casal, em breve um dos quartos vazios do imóvel comprado recentemente passará a ser ocupado.

Origem

Foto: Hugo BarretoAdeílson nasceu em Carolina (MA), mas foi em Redenção do Pará (PA) que passou parte da infância e adolescência. Aos 9 anos, começou a trabalhar como marceneiro, ofício aprendido com o pastor da igreja da mãe. Aos 32, mudou-se para São Paulo e, na capital paulista, conheceu o submundo das drogas.

A mãe de Adeílson soube da situação e resolveu buscá-lo. Envergonhado, decidiu vir a Brasília no início de 2013. Com R$ 930 no bolso, desembarcou no Distrito Federal. Sem ter para onde ir, fez da rua seu lar. Emocionado, recorda-se ter sofrido mais com palavras do que gestos.

“Sofri bastante preconceito. Um episódio que marcou demais foi quando um policial me abordou e disse que não valeria a pena perder tempo comigo, pois eu já estava condenado à morte. Eu era sujo, ficava quatro dias sem comer e as pessoas trocavam de calçada para não passar perto de mim.”

Fama de Herói

A sensibilidade de Adeílson ao abordar o estudante virou assunto em noticiário nacional. Já em tratamento na Salve a Si, viajou de avião pela primeira vez na vida para participar do programa “Caldeirão do Huck”, da TV Globo, onde ganhou R$ 20 mil no quadro “Agora ou Nunca”. Desapegado, doou o dinheiro para a mãe e para a Salve a Si.

Foto: Hugo BarretoJá regenerado, cultua o hábito de voltar com frequência à casa que o reabilitou para ensinar marcenaria aos homens que tentam se afastar do crack, da maconha, da cocaína ou do álcool. Entre uma instrução e outra, torna público seu poderoso testemunho.

Apesar da vitoriosa volta por cima, Adeílson sabe que poucos vão conseguir trilhar um caminho semelhante ao seu. Fala com a experiência de quem já viu dezenas de colegas padecerem perante o vício, impressão corroborada por preocupantes indicadores da Organização Mundial de Saúde (OMS): a cada 10 dependentes de crack, apenas dois conseguem ficar em sobriedade por mais de cinco anos.

Ao olhar a foto com aparência esquálida de quatro anos atrás, Adeílson não se envergonha. Pelo contrário, faz questão de mostrá-la. É uma forma que tem de resgatar o renovador, inspirador e sempre atualizado discurso: “Sempre é possível vencer, basta acreditar”, reflete.

Fonte: Saulo Araújo e Nathália Cardim/Metropoles.com