Preâmbulo
Em decorrência da pandemia, oriunda da Covid – 19, os lares tornaram-se refúgios impreteríveis à disposição dos indivíduos em 2020. Entre vários meios de entretenimento, a TV, assumiu seu lugar de destaque. Nesse contexto, aparecem os serviços de streaming, em especial a provedora Netflix, bastante utilizada pelos brasileiros. A empresa transmitiu, para mais de 62 milhões de contas, a minissérie O Gambito da Rainha. Como entusiastas do jogo de xadrez, há mais de 15 anos, não poderíamos deixar de assistir à produção, e tecer nossa singela opinião, conforme se segue.
Rápida Síntese
Com sete episódios: 1 – Aberturas; 2 – O torneio; 3 – Peões duplos; 4 – Meio jogo; 5 – Treinamento; 6 – Partidas adiadas e 7 – Fim de jogo) a minissérie “O Gambito da Rainha” retrata de forma bastante rasa e banal,o mundo enxadrístico, em especial os anos 60.
A minissérie prende a atenção do público feminino por ter como protagonista uma mulher, vestida na maioria das vezes elegantemente, e que encara seus dilemas e esmaga seus adversários, basicamente homens, no tabuleiro de xadrez, derrubando por terra o mito de que mulheres não podem superar os homens no jogo da estratégia.
Anacrônica, a mini série se inicia valendo-se de uma gigantesca recapitulação, isto porque Flashbacks ocorrem dentro do Flash back inicial, a protagonista, Beth Harmon, revive toda sua história, em um momento decisivo (a final de um torneio), diante do tabuleiro, frente ao mais temido e respeitado dos jogadores de xadrez da época (o personagem Borgov).
Harmon perdeu a mãe em um acidente; morou em um orfanato onde aprendeu xadrez com um humilde zelador; foi adotada por um casal. A partir de então, Harmon pôde finalmente participar de torneios e ajudar sua mãe adotiva com o valor das premiações que conquistava.
A história é recheada de suspenses e de movimentos demasiadamente rápidos de câmera exatamente no momento dos duelos mais esperados, repletos de tensão e nervosismo, não se pode apreciar bem as batalhas, porquanto o foco das câmeras está voltado mais para o rosto dos atores do que para o campo de guerra (tabuleiro), gerando uma tremenda quebra de expectativa haja vista não ser possível acompanhar os lances e as posições no tabuleiro, mas apenas o lado psicológico do jogo – ações e reações, olhares, gestos, comportamentos.
Pontos Negativos da Minissérie
Apesar de possuir um título forte, a minissérie pecou em alguns pontos, quais sejam: não explicou, ainda que minimamente, no que consiste a expressão “Gambito da Rainha”. A minissérie transmitiu uma idéia torpe do xadrez, baseada, sobretudo, na sujeição do jogador a vícios, tais como: remédios em excesso, bebidas, cigarros e outras. Apesar de ter havido jogadores que bebiam e fumavam, não representam a maioria dos enxadristas. Outro erro foi retratar na maior parte do tempo o xadrez intuitivo como a forma mais vigorosa de se obter êxito no esporte, pois é cediço que a maioria dos campeões foi forjada na base da preparação, dedicação, disciplina e estudo. Sem dúvidas, existiram jogadores geniais, como os mencionados na série: Morphy e Capablanca. Porém, não são a regra. Existiram vários campeões mundiais que chegaram ao topo, sem necessariamente disporem de genialidade, mas sim de dedicação e treino, como por exemplo: Alekhine,Botivinnik, Smyslov, Petrosian, Spassky, Fischer, Karpov, Kasparov, Kramnik, Topalov, Anand e Carlsen.
Pontos positivos da minissérie
Revela a necessidade de se aprender a dizer não para influências ruins, drogas, álcool e qualquer outro entorpecente. Permite aprender que o ganhar é bom, mas deve-se saber perder e assimilar lições com as derrotas. Possibilita aprender a ser disciplinado (a), e a acreditar que o esforço e a dedicação permitem atingir resultados, e que a amizade sincera pode até estar longe, mas nunca te abandonará. A minissérie também nos faz perceber que trabalhar em equipe é uma habilidade fundamental! A minissérie conseguiu reacender a paixão das pessoas pelo jogo de xadrez. Por fim, ensina que a humildade deve ser sempre prevalecer sobre qualquer vaidade ou arrogância.
O que é o Gambito da “Rainha”?
De início, cumpre esclarecer que o usual é chamar “Dama” e não Rainha. Assim, Gambito da Dama é uma entre várias maneiras de se iniciar a abertura no jogo de xadrez. Trata-se de abertura sólida e fechada em que o peão da Dama é o que abre o jogo, avançando duas casas e dominando o centro do tabuleiro, ao mesmo tempo em que é defendido pela peça mais ativa do jogo, a Dama. Em seguida, as brancas entregam “gambitam” o peão do Bispo da Dama. Por isso o nome Gambito da Dama, por ser um peão da Ala da Dama que é sacrificado. Busca-se com isso desenvolver rapidamente as peças, dominar o centro e colocar o Rei imediatamente em segurança, atendendo aos três princípios fundamentais do xadrez. Feito isso, nascem naturalmente às condições ideais para ataques fulminantes contra o adversário.
Necessário frisar que O Gambito da dama, pode ser aceito (se capturado o peão) ou recusado (se não for capturado), o que muda substancialmente a sequência do jogo, gerando linhas diferentes.
O Confronto Final
Voltando a análise para a derradeira e mais importante partida disputada entre Harmon e Borgov, pode-se verificar o seguinte: Borgov aceita o gambito, e a partida ganha o seguinte rumo, conforme ilustrado abaixo, por meio de diagramas:
Enfim, Harmon inicia o jogo lutando pelo domínio das casas centrais. Seu adversário até resiste no início. Mas no meio jogo, Harmon já se impõe! Força o recuo do Cavalo adversário e controla o centro. Já na fase final do jogo, a protagonista faz um sacrifício de Dama decisivo, e com vantagem material de Bispo e Torre, após promover um peão para Dama (recuperando a peça sacrificada), o jogo está ganho para as Brancas. Borgov até insiste em alguns xeques, mas desiste, pois não há como reverter à situação, em poucos lances entraria numa rede de mate!
